sábado, 15 de março de 2014

Manual do Mau Jornalismo

Paulo Werneck

Há muito tempo não leio Veja, Globo, Folha e Estadão, dos quais, em épocas distintas, já fui assinante. Não os leio porque não tenho tempo para desperdiçar com textos desinformativos e mentirosos.

Não estou sozinho na avaliação, a ponto de ter sido cunhada uma abreviatura para designar essa imprensa, PIG, que significa Partido da Imprensa Golpista, mas que também é a palavra inglesa para porco.

Os que me conhecem sabem que compartilho de sonhos libertários, igualitários e solidários, o mote da Revolução Francesa - que mesmo assim cometeu o Terror, a Vendéia, se engoliu e pariu um imperador... Mas sonhos são sonhos e guiam nossos passos, enquanto a realidade às vezes deixa muito a desejar.

Da realidade, todavia, é que deveria tratar os jornais, deixando a opinião para os editoriais. Não é todavia a prática da "grande" imprensa brasileira.

Para não ficar no blá blá blá exemplificarei com uma matéria do "O Globo", intitulada "Voo baixo: Brasil tem a 7ª maior economia mas alta do PIB perde para emergentes": crescimento em 2013 só superou o da África do Sul e do México", publicada em 28 de fevereiro na página 29 da segunda edição.

O leitor desavisado já fica sabendo de cara que o Brasil está na sétima posição - o que não é novidade nem nada de tão importante assim, mas que cresceu muito pouco, perdendo para todo mundo, andando para trás.

A matéria também apresenta dois gráficos:


Logo no primeiro parágrafo sabemos que a matéria só se baseia em 25 países dos quase 200 atualmente existentes, ou seja, muito pouco para fazer generalizações.

Depois diz que o crescimento brasileiro só foi maior que o da África do Sul e do México, mas, consultando a tabela que é apresentada na mesma matéria, podemos ver que superou também os Estados Unidos, a França, o Reino Unido, a Alemanha.

O redator, não omite que está falando das economias emergentes dessa reduzida lista de 25 países, mas o leitor tem que estar atento e digerir palavra a palavra para não ficar com a impressão errada.

Todavia o FMI lista quase uma centena de países emergentes (World Economic Outlook, edição 2013). Assim a lista de emergentes considerada pela matéria está extremamente resumida.

A opinião de Alex Agostini, economista chefe da Austin Rating, que reconhece que o Brasil foi melhor que as grandes economias "que ainda se ressentem da crise".

Que crise? Algum tsunami, seca renitente, guerra? Não: crise provocada por eles mesmos, ao desregularem o mercado financeiro.

Os países desenvolvidos podem crescer pouco porque se enfiaram eles mesmos numa crise, mas o Brasil - entenda-se a Dilma, o PT - que se saiu airosamente da crise, apesar de sofrido a retração de parte considerável do seu mercado externo, tem voo baixo porque cresce menos que alguns países.

Assim se publicam dados verdadeiros, entremeado por omissões, destaques e comentários cuidadosamente selecionados, para levar o leitor apressado ou acrítico a partilhar a opinião que o dono do jornal quer ver espalhada na sociedade em apoio ao projeto político dele.

Por falar em firmas de avaliação de risco, vale lembrar que seis dias antes do colapso do Lehman Brothers a avaliação dele era AAA pela Standard & Poor's (S&P), e até a véspera pela Moody's. Enquanto isso, o Brasil que nunca deixou de pagar nada, é avaliado pela Austin Rating (quem?) como BBB...

Recolhi na Wikipedia as avaliações abaixo (List of countries by credit rating):

BrasilEstados Unidos
notaconceitonotaconceito
Standard & Poor'sBBBNegativeAA+Stable
Fitch RatingsBBBStableAAAWatch Negative
Moody'sBaa2PositiveAaaNegative
DBRSBBBStableAAAUnder Review, Negative
DagongA-NegativeA-Negative
JCRBBBStableAAAStable
China ChengxinBBBg+StableAAAgStable
Uma observação: a dívida pública brasileira alcança 45% do PIB, enquanto a americana está na casa dos 75%...